quarta-feira, 26 de maio de 2010

O SORRISO DE TINA

Da sua vida como velho professor, haviam restado recordações bastante agradáveis. Colegas com os quais havia desenvolvido uma bela amizade, outros cuja lembrança era apenas superficial, alunos que se transformaram em amigos especiais, enfim toda uma vida de recordações que agora depois de aposentado, voltavam a sua memória com certa nostalgia e regularidade.

Ao longo de sua extensa vida de mestre escolar, muitas almas passaram por sua orientação, e ele sempre se orgulhara de as haver conduzido com paciência e sabedoria. Agora gozando do merecido descanso, recordava-se com carinho de algumas figuras que sabia, ficariam para sempre retidas na sua recordação. D e todas guardaria uma terna saudade, mas havia uma, cuja lembrança seria sempre muito especial. Seu nome era Tina.

‘” Ela deveria ter por volta de dezessete anos e tinha sempre um sorriso nos lábios.

Isso não seria nada extraordinário se Tina não sofresse de paralisia cerebral, o que tornava seus músculos rígidos e de modo geral ingovernáveis. Como tinha dificuldade para falar, --usava aquele sorriso radiante, para expressar a sua personalidade. Tina era uma ótima garota, e todos gostavam dela. Costumava usar um andador para se deslocar pelos corredo---res movimentados da escola. Os outros alunos não sabiam como se aproximar dela, talvez porque fosse diferente dos demais. Mas Tina parecia não se importar e costumava quebrar o gelo com as pessoas que encontrava, cumprimentado a todos com um sonoro “oi” que era respondido sempre com alegria.

O dever de casa, determinado pelo velho professor, consistia em decorar três estrofes do poema “Não Desista”, cuja pontuação segundo o mestre valeria dez pontos, porque achava que a maioria dos seus alunos não conseguiria cumpri-la, declamando-a de forma correta. Por esta razão, não esperava grande coisa dos alunos daquela aula. Tina fazia parte destes alunos e o mestre percebeu em seu rosto uma expressão diferente da habitual. Ela parecia muito preocupada.

Quando chegou a hora de recitar o poema, o professor foi seguindo a lista de chamada e tudo aconteceu conforme ele previra; uns após outros, os alunos erravam ao recitar o poema. A desculpa era sempre a mesma “Desculpe professor, mas isso sò vale dez pontos mesmo, não e?” Um pouco frustrado e mais no sentido de brincadeira, o mestre disse que o próximo que não recitasse o poema corretamente teria que se deitar no chão, e fazer ali na sua frente dez flexões seguidas. Era um resquício de uma técnica de disciplina dos seus tempos de professor de educação física, uma espécie de multa a ser paga pelo não cumprimento de uma tarefa estabelecida. Os alunos foram se apresentado, ate que chegou a vez de Tina recitar o poema. Ela começou bem, mas percebiasse claramente o seu nervosismo. No fim da primeira estrofe, cometeu um erro. Antes que alguém pudesse dizer qualquer coisa, empurrou o andador para o lado, deitou-se no chão, e começou a fazer as flexões como os outros alunos haviam feito. O velho professor ficou horrorizado, tentando dizer a ela que estava apenas brincando. Mas Tina arrastou-se ate o andador,ficou de pè diante da turma e recomeçou o poema e foi ate o fim,sem mais nenhum erro. Foi uma das poucas pessoas da turma a declamar o poema sem um erro sequer.

Quando ela terminou, um dos colegas perguntou = “-Tina, porque você fez isso? A tarefa só valia dez pontos!”

Tina levou algum tempo para achar as palavras para responder.

“Sabe porque? Eu quero ser igual a vocês todos...Quero ser normal.”

O silêncio tomou conta da sala inteira ate que um outro aluno exclamou;

-“Tina,nos não somos normais,somos apenas adolescentes ! Estamos sempre metidos em alguma encrenca,o tempo todo.”

-“Eu sei”disse Tina com seu encantador sorriso. Só que naquele dia o sorriso de Tina tinha uma alegria, um colorido especial Ela havia, mercê de sua fibra, de seu valor, conquistado o direito de ser uma “igual”, uma igual a todos os outros garotos e meninas da sua classe.

Naquele dia, Tina ganhou seus dez pontos. Mais que isso, ganhou o amor e o respeito de seus colegas, que, para ela, valiam muito mais que os dez pontos da sua tarefa escolar.

Esta história, permanece ate hoje gravada nas recordações do velho professor, como uma das mais belas demonstrações de força e também de caráter que ele pode presenciar ao longo de toda a sua carreira de mestre e educador.

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